Discussões sobre política e orçamento não poderiam ficar de fora do maior evento científico do Brasil, a 66ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada esta semana na Universidade Federal do Acre (Ufac). O segundo dia da programação científica do encontro foi marcado por debates sobre o futuro financeiro da ciência nacional e os planos dos candidatos à Presidência da República para a área.
O atual ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Clelio Campolina, compartilhou com o público as suas expectativas em relação ao orçamento de sua pasta para o próximo ano, cuja proposta será encaminhada ao Congresso no mês que vem. Campolina se mostrou confiante de que ciência e inovação não sofrerão cortes. “Não estamos discutindo cortes, estamos discutindo aumento”, disse, otimista, em resposta às indagações de lideranças da SBPC e da Academia Brasileira de Ciências (ABC).
Durante sua conferência, o ministro abordou o novo programa do governo federal Plataformas do Conhecimento (PFPC), que visa elevar parâmetros qualitativos e quantitativos de ciência, tecnologia e inovação. Segundo Campolina, as plataformas são arranjos público-privados para viabilizar as pesquisas de fronteira. “Essa articulação vai ser feita de forma contratual entre base científica e setor privado, podendo até ter um braço internacional”, pontuou.
As plataformas serão coordenadas por comitês da Casa Civil e dos ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação e Educação, com a participação de representantes da comunidade empresarial, representados pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), e da comunidade científica, por meio da SBPC e das agências de fomento à pesquisa.
Pesquisadores presentes manifestaram preocupação com o programa, temendo que a nova empreitada desvie recursos do setor. “Queremos ter certeza de onde virão os recursos e qual será a base para a manutenção do programa”, disse a presidente da SBPC, Helena Nader.
O ministro garantiu que o novo programa usará recursos próprios e não afetará outros projetos. “O PFPC vem para complementar e ampliar os programas já em andamento, de nenhuma maneira o novo programa vai concorrer ou inviabilizar os projetos já em andamento”, afirmou. “É uma política de governo, de longo prazo, e que só será implantada se houver orçamento.”
Campolina também aproveitou a ocasião para divulgar seus próximos passos no ministério. Manifestou seu desejo de lançar um novo edital do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), que, em 2011, distribuiu recursos para modernizar e recuperar a infraestrutura de instituições públicas de ensino superior e de pesquisas. O novo edital viria para finalizar as obras não concluídas em universidades que receberam recursos do programa no edital anterior.
Presidenciáveis ausentes
Na agenda da reunião anual também estava prevista uma sessão com a participação dos candidatos à presidência Aécio Neves, Dilma Rousseff e Eduardo Campos para abordarem seus planos de governo. No entanto, compareceu apenas a candidata à vice-presidência na chapa de Eduardo Campos, Marina Silva. Campos cancelou a presença no evento em razão da morte do amigo escritor Ariano Suassuna. Neves informou que não iria participar devido a problemas com a agenda e Rousseff não chegou a responder ao convite.
Na conferência, Marina Silva respondeu às perguntas da plateia e defendeu a importância da parceria entre o governo e a comunidade científica. “Ciência, tecnologia e inovação são fundamentais para o desenvolvimento de toda e qualquer sociedade”, disse. “Sem ciência, fica difícil fazer jus às grandes vantagens comparativas que o Brasil tem. Para isso, é preciso investimento adequado na formação e educação das pessoas.”
A candidata também ressaltou a necessidade de levar em conta as especificidades da região amazônica ao se pensar sobre o seu desenvolvimento. “A Amazônia suscita uma economia diversificada, em que tenha lugar a agricultura familiar, o extrativismo, o agronegócio, o turismo e a biotecnologia, e a ciência é fundamental para ajudar na produção de novas maneiras econômicas”, afirmou.
Inovação e formação de jovens
Outro ponto historicamente debatido nas reuniões da SBPC que voltou à baila nesta edição foi o conflito entre publicar ou patentear inovações e descobertas, tema da conferência ‘Publicações ou patentes: um falso dilema da ciência no Brasil’, ministrada pelo médico e diretor de Cooperação Institucional do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Paulo Sérgio Beirão. Para o palestrante, não deve haver conflito entre patentear e publicar, ações que devem ser tomadas em conjunto para garantir a produção acadêmica e o direito do país sobre suas inovações.
No ramo da inovação, os jovens mais uma vez marcaram presença. Os vencedores do XXVII Prêmio Jovem Cientista participaram da reunião apresentando suas pesquisas e invenções com o tema água.
Um dos destaques foi o estudante Edvan Nascimento Pereira, do Pará, vencedor da categoria ensino médio, que desenvolveu um método de tratamento de água que usa um carvão feito a partir do caroço do açaí.
O tema da próxima edição do concurso já está decidido e foi lançado na abertura da reunião pelo presidente do CNPq, Glaucius Oliva: ‘Segurança Alimentar e Nutricional’. As inscrições para o prêmio estarão abertas a partir do dia 4 de agosto.
Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line