O tema é batido. Mas nunca é demais lembrar: “Nessa nova etapa do capitalismo, é a produção de conhecimento a força responsável por agregar cada vez mais riqueza a uma sociedade.” O recado é da socióloga Sônia Guimarães, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
“Conhecimento e pesquisa científica podem resultar em muito mais crescimento econômico do que fatores tradicionais como terra e trabalho”, disse a pesquisadora. O assunto marcou presença no 37º encontro anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), realizado nesta semana em Águas de Lindoia (SP).
Guimarães mostrou que, em 2010, 30% do Produto Interno Bruto mundial foram resultado direto de uma economia baseada em tecnologia e conhecimento. Nada menos que 18 trilhões de dólares – e essas cifras tendem a crescer cada vez mais. “No caso dos Estados Unidos, por exemplo, hoje cerca de 40% da receita do país são baseados em produtos e serviços de base tecnológica”, afirmou a pesquisadora. E a palavra da moda – inovação – costuma ser entendida como essencial para que um país possa trilhar esse caminho.
Dados e números
E o Brasil, como está? “A inovação por aqui ainda é muito efêmera”, lamentou a socióloga. “As exceções confirmam a regra.” Segundo ela, isso tem a ver com o modelo de universidade adotado no país. As instituições de ensino superior têm dificuldades burocráticas e operacionais para interagir com os setores produtivos da sociedade.
“Nosso conhecimento permanece, em grande parte, limitado às prateleiras de nossos laboratórios e instituições de pesquisa”, desabafou Guimarães.
A propósito, qual é o lugar do pesquisador ávido por inovação? Universidade pública ou iniciativa privada? A questão divide opiniões – e duelos acirrados podem emergir desse necessário debate. Para ilustrar o cenário global, a pesquisadora da URFGS apresentou alguns dados mostrando como essa divisão acontece em vários países.
Para visualizar esses dados com mais clareza, a CH On-line preparou um gráfico interativo que mostra como os cientistas se distribuem entre setor privado, ensino superior e cargos governamentais. Os dados são de 2007, reunidos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD).
Detalhe: para 2007 não há dados suficientes sobre a distribuição nos Estados Unidos. Por isso o gráfico traz uma aparente ausência. De qualquer maneira, esses números são enredo de querelas as mais diversas entre acadêmicos, gestores e empresários.
Na carona do raciocínio, a socióloga da UFRGS enveredou por um outro tema sensível: a parcela do Produto Interno Bruto (PIB) que é destinada a investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D). Ao longo da última década, esse tem sido um assunto muito discutido entre especialistas.
Em terras brasileiras, tal porcentagem tem sido pouco alterada nos últimos anos – permanece próxima de 1%. Mas, em termos absolutos, os valores brutos têm crescido significativamente – acompanhando o suntuoso aumento do PIB experimentado por nosso país.
Comparando-se o percentual do PIB nacional investido em P&D em diversos países, chama a atenção o fato de o bloco dos chamados BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) apresentar valores inferiores à média mundial, que vem se mantendo próxima de 2% desde 1996. Por outro lado, na América do Norte, por exemplo, o índice tem variado entre 2,5% e 2,8%. Já o Japão tem investido mais de 3% de seu PIB desde o ano 2000.
Internacionalização da ciência
O debate sobre a economia do conhecimento é tangente às questões de internacionalização da ciência. A tecnologia, afinal, é hoje profundamente enraizada em colaborações entre profissionais de diversas partes do globo.
A pesquisadora Elizabeth Balbachevsky, da Universidade de São Paulo (USP), destacou: “Quando realizada em redes abertas, a ciência tende a se desenvolver com muito mais rapidez e eficácia.”
Ela citou um exemplo prático. O governo norte-americano por muito tempo se dedicou ao desenvolvimento de técnicas de criptografia para segurança de dados – em laboratórios e centros restritos a poucas instituições autorizadas. Ao mesmo tempo, instituições bancárias de todo o mundo se empenhavam em desenvolver exatamente a mesma tecnologia – mas em redes abertas de cooperação global.
“Resultado: a tecnologia alcançada pelas pesquisas restritas do governo estadunidense foi muito inferior àquela alcançada pelas pesquisas em cooperação das entidades financeiras”, disse a pesquisadora da USP. Segundo ela, em uma rede bem desenhada, os pontos de experimentação são mais numerosos. “Assim, a tecnologia tende a se desenvolver não só com mais agilidade, como também com mais qualidade.”
Henrique Kugler*
Ciência Hoje On-line
*O jornalista viajou a Águas de Lindoia a convite da Anpocs.