Muitos problemas e ideias matemáticas se passam em tabuleiros. Não é surpresa, aliás, que alguns jogos tenham uma natureza matemática intrínseca, como damas ou xadrez. E, entre as peças de xadrez, o cavalo é a que se move de maneira mais curiosa. Lembremos como é o seu movimento.
Os movimentos do cavalo se dão em ‘L’, ou seja, ele pode se deslocar: i) duas casas horizontalmente e, depois, uma verticalmente; ii) ou duas casas verticalmente e depois uma horizontalmente. A figura ao lado mostra, em um tabuleiro em tamanho reduzido, as posições (X) que o cavalo poderia ocupar após uma jogada – aliás, vale lembrar que o cavalo pode passar por cima das outras peças.
O jogo de xadrez se passa em um tabuleiro de oito casas por oito casas (8 x 8), mas, para nossos propósitos aqui, vamos considerar um tabuleiro mais simples (3 x 3) e, nele, dispor quatro cavalos, como na figura a seguir.
Em 1512, o italiano Paolo Guarini de Forli (1464-1520) propôs o
seguinte problema: é possível passar os cavalos brancos para os cantos de baixo e os cavalos pretos para os de cima? E qual o menor número de movimentos para fazer isso? Mesmo em nosso tabuleiro reduzido, a tarefa fica complexa rapidamente…
Aqui entra em cena uma velha estratégia da matemática para solucionar problemas: transformar um problema em outro equivalente, no qual a cenário fica mais simples. Em nosso caso, começamos numerando as casas do tabuleiro.
Agora, podemos identificar cada movimento do cavalo. Por exemplo, um cavalo que está na casa ‘1’ só pode ir para as casas ‘6’ e ‘8’. Dessa forma, nosso problema no minitabuleiro 3 x 3 se torna um problema em um grafo, estrutura formada por pontos (vértices) e linhas (arestas).
Nessa nova versão do problema, tudo fica muito mais simples. Cada movimento no tabuleiro corresponde a um movimento no grafo e vice-versa. Assim, é possível trocar a posição dos cavalos pretos com as dos brancos, fazendo simplesmente uma ‘rotação’: todos os cavalos andam uma casa – pode ser no sentido horário ou anti-horário. Por exemplo, 1 → 8; 3 → 4; 9 → 2; 7 → 6. Repetindo essa jogada quatro vezes, acabamos com cavalos brancos em 7 e 9, e os pretos em 1 e 3. Assim, trocamos as posições dos cavalos pretos com as dos brancos.
Para efetuar a troca, tivemos que realizar 16 movimentos. Também podemos ver que esse é o número mínimo de jogadas, pois os cavalos sempre se moveram em direção à sua casa final, sem ‘desperdício’ de movimentos. Além da agradável surpresa em resolver nosso problema, esse exemplo ilustra uma área interessante da matemática, a teoria de grafos. Muitos problemas podem ser reinterpretados como problemas em grafos. E, feito isso, a solução virá… como um xeque-mate!
Solução do desafio passado: Como inicialmente o patinho azul está em uma ‘cadeira preta’, após cinco transposições, ele estará em uma cadeira branca. Então, Merlin deve pedir que Vivi remova o patinho à direita dela – o patinho removido estará em uma cadeira preta. Depois disso, a ‘mágica’ segue o mesmo roteiro.
Marco Moriconi
Instituto de Física
Universidade Federal Fluminense
moriconi@cienciahoje.org.br