O físico norte-americano John Boright não acredita que poderemos evitar os impactos das mudanças climáticas, mas crê que a ciência, tecnologia e inovação nos ajudarão a lidar com elas. Diretor executivo do Escritório de Assuntos Internacionais das Academias Nacionais dos Estados Unidos, Boright se autodescreve como um otimista moderado: “Com tecnologia, ciência e inovação, encontraremos iniciativas que aumentem nossa eficiência energética, prejudicando menos o ambiente”.
Dentro dessa instituição, que reúne as academias de ciência, engenharia e medicina norte-americanas, sua função é estimular a cooperação entre as academias do mundo e assim ajudar os governos a formular políticas públicas baseadas em informações científicas.
Boright esteve no Rio de Janeiro em fevereiro último para participar de um congresso de política científica e da mesa-redonda ‘Desenvolvimento sustentável, inovação e a parceria Brasil-Estados Unidos em ciência e tecnologia’ no Consulado Geral dos Estados Unidos.
Em entrevista exclusiva à Ciência Hoje, ele fala sobre a cooperação entre os dois países, os efeitos da crise financeira de 2008 na ciência norte-americana e a importância da interação da academia com a sociedade.
Qual a função do escritório de Assuntos Internacionais das Academias Nacionais dos Estados Unidos?
As Academias Nacionais reúnem três academias: ciência, engenharia e medicina. Desde o começo, em 1863, quando o então presidente Abraham Lincoln [1809-1865] assinou o estatuto, as Academias sempre tiveram a função de assessorar o governo federal, apesar de não serem instituições governamentais. O nosso trabalho internacional é baseado nisso, na ideia de auxiliar academias de outros países a fornecer dados baseados em evidências que os seus governos possam usar para montar suas políticas públicas, seja em educação, segurança alimentar etc. Outra coisa que fazemos, embora não se aplique ao Brasil, é promover o diálogo com a comunidade científica de países com os quais os Estados Unidos não têm uma boa relação, como o Irã.
Houve muita cooperação com o Brasil nos últimos anos. Quais foram as principais áreas?
A Academia Brasileira de Ciências [ABC] teve um papel essencial nos primeiros cinco ou seis anos do acordo regional, que envolveu o continente americano, do Canadá a Argentina. O Brasil sediou o secretariado e foi codiretor do grupo de coordenação. Queríamos muito essa parceria, porque nossa percepção é que historicamente não tivemos interação suficiente com as Américas Central e do Sul. Também cooperamos com a ABC na rede global de atividades, melhorando a competência ao redor do mundo, e num grupo de 15 academias de ciências de várias nações que faz sugestões para políticas públicas nos fóruns econômicos. Realmente acreditamos que o posicionamento em conjunto é valioso, pois elimina qualquer percepção de que uma academia de ciências estaria falando em prol de seu país apenas. As principais áreas de cooperação são questões como mudanças climáticas, política energética e melhorias na saúde em nível global. Por exemplo, o problema das doenças infecciosas é mundial e, por definição, necessita de cooperação real.
Que tipo de abordagens foram criadas por essa cooperação?
No caso das doenças infecciosas, houve grandes melhoras. Novas infecções surgem de surpresa, como no caso do ebola e do HIV, por isso um dos primeiros e mais importantes passos é ter uma comunicação aberta e transparente. Doenças que podem vir a se tornar problemas terríveis começam de maneira discreta e ninguém consegue entendê-las a princípio. Se não houver comunicação, a situação pode ficar pior ainda. Um caso dramático foi o da China, que tem feito um esforço grande de abertura. Os chineses já haviam aprendido as lições e os problemas que a falta de comunicação pode causar quando tiveram que lidar com a gripe aviária. Ou seja, a cooperação entre as academias de ciência está levando a um mundo mais seguro, porque compartilhamos informação sobre surtos epidêmicos. A China também está trabalhando para melhorar sua eficiência energética e no desenvolvimento de energias renováveis, bem como no fechamento das indústrias mais poluentes. Isso está acontecendo porque suas academias de ciência estão dando sinais claros dos impactos que as mudanças ambientais e saúde pública podem ter em sua economia.
Já no caso das mudanças climáticas, creio que estamos todos um pouco frustrados porque os acordos mundiais parecem não ter avançado muito; por outro lado, eles estão caminhando. Além disso, há passos importantes tomados por países e estados, como a Califórnia, que estão mostrando um rumo. Nesse momento, é importante que as academias de ciência expliquem de maneira clara as vantagens das políticas que aceleram a retirada de carbono dos nossos sistemas energéticos.