No Ano Internacional da Saúde das Plantas, um livro sobre a inteligência dos vegetais é um impulso animador para se observar a natureza para além da paisagem e lutar contra a sua depredação.
Em tempos de amplo descaso com a natureza, compreender como as plantas funcionam, se defendem sem poder caminhar, pulsam sem ter músculos e se lembram sem ter uma memória convencionalmente aceita, como a dos animais, parece ser uma boa pedida – especialmente se a linguagem é clara e de fácil compreensão. Essa é a proposta do livro Revolução das Plantas, do italiano Stefano Mancuso, professor e pesquisador da Universidade de Florença, onde dirige o Laboratório Internacional de Neurobiologia Vegetal. Sua obra literária em divulgação científica é ampla, focada em curiosidades sobre o funcionamento plantas, com base em experimentos científicos comprovados.
Com uma extensa rede de colaboradores em todo planeta, Mancuso é reconhecido internacionalmente por seu empenho em testar, cientificamente, a inteligência das plantas. Em sua nova obra, propõe expandirmos nosso olhar sobre esses seres vivos para aprendermos seus segredos e usá-los como recursos inspiradores na solução de problemas práticos da humanidade.
O autor chama a atenção para a incrível sofisticação das plantas e dos diferentes caminhos desenvolvidos por elas na sobrevivência, tão distintos dos mecanismos animais. É nessa ampla diferença que Mancuso mostra como nós, humanos, ainda vemos as plantas como seres inferiores e pouco inteligentes. E assim as negligenciamos.
O livro passeia deliciosamente por relatos de fantásticos mecanismos de funcionamento das plantas, combinando histórias de pesquisas inovadoras com as experiências pessoais de Mancuso como cientista. No capítulo Memórias sem cérebro, o autor discute como as plantas possuem mecanismos de memorização e aprendizado com experiências próprias, a exemplo da espécie Mimosa pudica, conhecida como dormideira. Esta planta possui folhas que delicadamente se fecham sob a ação de um estímulo externo, por exemplo, ao nosso toque. Ao fazer um interessante passeio histórico dos estudos acerca desta planta, Mancuso chega aos experimentos realizados por ele e seus parceiros para discutir a questão da memória e de qual seria o tempo de lembrança da planta. O autor faz ainda um paralelo importante, de como a compreensão do funcionamento da memória nos seres vivos sem cérebro pode auxiliar na compreensão, por exemplo, de formas particulares da memória localizadas fora do sistema nervoso humano.
Em Democracias verdes, outro capítulo, são discutidas as diferenças entre o mundo animal e vegetal. Contrariamente aos animais, as plantas não têm órgãos únicos ou mesmo duplos, capazes de realizar funções específicas. Elas distribuem suas funções por todo seu organismo. Como são fixas no solo, órgãos específicos seriam uma deficiência, pois perder o fígado ou o cérebro num ataque de predadores, como um simples inseto, seria mortal. Segundo Mancuso, plantas distribuem suas funções: “respiram por todo corpo, veem com todo corpo, sentem com todo corpo e calculam por todo corpo… Em certo sentido, sua organização é a própria marca da modernidade: elas têm arquitetura modular, cooperativa e distribuída, sem centros de comando, capaz de suportar perfeitamente predações catastróficas e repetidas”. Aspectos sociais e filosóficos, baseados em suas observações científicas, são fartamente encontrados ao longo do livro, enriquecendo a leitura.
Ainda é possível compartilhar projetos inovadores desenvolvidos pelo autor e seus colaboradores com tecnologia baseada nas ferramentas vegetais. É interessante observar como Mancuso conduz o leitor ao exercício da observação do que nos cerca e de como podemos fazer uso de coisas simples para a melhoria da vida em nosso planeta.
O livro é um impulso animador para se observar a natureza para além da paisagem e lutar contra sua depredação, já que espécies em extinção possuem mistérios que poderemos nunca vir a desvendar. Na comemoração internacional do Ano internacional da Saúde das Plantas, em 2020, proteger a biodiversidade do planeta e conhecer algumas de suas maravilhas escondidas é certamente uma opção cidadã.
Claudia Rezende
Instituto de Química
Universidade Federal do Rio de Janeiro
A trajetória acadêmica de um dos maiores nomes da ecologia no Brasil mostra um pouco dos bastidores da ciência e como as pesquisas são essenciais para entendermos e enfrentarmos as mudanças ambientais causadas pelas atividades humanas
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