Doutores em saberes tradicionais

Jornalista ICH

Professora da UFMG, Vanessa Tomaz fala sobre como a aprovação de Notório Saber para mestres indígenas, afro-brasileiros, quilombolas, de culturas populares e povos tradicionais colabora para o processo de decolonização nas universidades brasileiras

Seu Valdemar Xakriabá, um ancião e grande mestre da oralidade, não acredita que um ‘doutor’ se forma em apenas quatro anos, como é padrão nas universidades brasileiras, mas sim com o conhecimento acumulado por uma pessoa em uma vida inteira. Desde agosto de 2020, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) ‘concorda’ com Seu Valdemar: uma resolução tornou possível a atribuição de Notório Saber, equivalente a doutorado, a mestres indígenas, afro-brasileiros, quilombolas, de culturas populares e povos tradicionais. Professora da Licenciatura Intercultural Indígena da UFMG, Vanessa Tomaz é uma das envolvidas na produção dos memoriais, dossiês que esses mestres e mestras precisam apresentar para receber o título. Nesta entrevista, ela conta como a medida representa um passo na revolução epistêmica que está se dando nas universidades. “É um movimento concreto de democratização e de reparação histórica, é reconhecer que esses saberes são conhecimento da formação da cidadania”, avalia a professora, que trabalhou no memorial do agora oficialmente doutor Valdemar.  

CIÊNCIA HOJE: A UFMG aprovou recentemente uma resolução que torna possível a atribuição de Notório Saber, equivalente a doutorado, a mestres e mestras indígenas, afro-brasileiros, quilombolas, das culturas populares e de povos tradicionais. Como esse avanço foi decidido?

VANESSA TOMAZ: Antes de tudo, é importante dizer que esses espaços não são dados, são conquistados, são fruto de um movimento muito forte de resistência desses povos. Essa resolução, aprovada em 2020, vem de uma longa trajetória da UFMG de parceria com vários povos originários e comunidades tradicionais. Essas parcerias são feitas por meio de projetos de extensão, pesquisa e de outros vínculos. Na questão da educação indígena, por exemplo, a UFMG tem participação de longa data, formando professores indígenas e contribuindo para a implantação das escolas indígenas em Minas Gerais, previstas na Constituição Cidadã de 1988 e na LDBN [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional]. Então, foi surgindo a necessidade de trazer não só esses sujeitos para dentro da universidade, mas, também, seus saberes, valorizando suas formas de conhecimento, porque, sem isso, vamos manter essa perspectiva da vida colonial.

Esses espaços não são dados, são conquistados, são fruto de um movimento muito forte de resistência desses povos

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